domingo, 27 de novembro de 2011

1 CONTEXTO NO QUAL SURGIU A TEOLOGIA AFRO-AMERICANA

Entre os principais fatores que levaram a uma reflexão teológica negra, está o sofrimento por causa da cor da pele. Segundo uma visão europeia, esta situação nunca foi considerada suficiente para a elaboração de uma reflexão propriamente teológica e porque também, segundo o autor Colombianito, naquela época, a existência dos escravos, jamais foi motivo de grande preocupação para a ética Cristã[1]. Uma justificativa pode estar ligada ao fato de que sempre existiram escravos nas diversas culturas e povos, embora não fossem tratados como mercadoria e objeto de exploração e de lucro. A experiência de fé acontece, portanto, dentro de uma sociedade marcada pelo racismo, opressão e marginalização com relação aos descendentes de africanos. Estes são pontos comuns com os outros continentes onde tem presença negra; as experiências de Deus vividas por estas outras comunidades é que serão referência básica para levar adiante uma reflexão teológica negra em contexto latino-americano e caribenho[2].
É muito importante mencionar que em seu percurso, o pensamento teológico afro-americano foi corroborado pela prática da Igreja que se mostra aberta com o real compromisso com as causa dos mais empobrecidos, excluídos do mundo. A partir do concílio Vaticano II, começa-se a surgir uma nova postura eclesial, com relação à população do continente. Esta tem seu início em Medelím, Colômbia, mas é precisamente em Puebla, que se nota a predominância de uma opção pastoral libertadora por parte da Igreja latino-americana e caribenha. Puebla é o primeiro documento da Igreja que menciona a realidade dos afrodescendentes[3] quando fala das feições concretas dos “sofredores nas quais deveríamos reconhecer as feições sofredoras de Cristo: feições de indígenas e, com frequência, também de afro-americanos, que, vivendo segregados e em situações desumanas, podem ser considerados como os mais pobres dentre os pobres” (Puebla n. 34). Uma outra menção foi numa nota de rodapé do parágrafo oito quando diz que “o problema dos escravos africanos não mereceu, infelizmente, a devida atenção evangelizadora e libertadora da Igreja” (Puebla  n. 8).  Foram contribuições muito boas e determinantes, mas segundo o teólogo negro, A. A. da Silva, de saudosa memória, esperava-se que o documento dedicasse maior atenção à Comunidade Negra, chegando até a dizer que o assunto foi tratado "perifericamente". No entanto, ele continua o texto, afirmando que, "apesar do espaço reduzido, a alusão feita aos afro-americanos revestiu-se de força na medida mesma em que foi relacionada com a figura de Cristo, e por isso causou impacto nas comunidades"[4].
Neste sentido, os avanços foram substancialmente reforçados pela consolidação da Teologia da Libertação e pela experiência das Comunidades Eclesiais de Base, aliadas a uma nova metodologia pastoral, catequética e litúrgica. Nas CEBs, muitos negros e negras puderam assumir a condição de protagonistas da Igreja, através da participação na vida comunitária e eclesial[5]. Este novo projeto da Igreja permitiu um estímulo recíproco entre práticas eclesiais e reflexões teológicas, possibilitando a descoberta dos múltiplos rostos de Deus, até do “rosto negro de Deus”. A partir desta descoberta percebe-se que Deus não está nem nunca esteve distante dos negros e negras em sua história de dor e sofrimento. Assim, “a história enquanto expressão da cotidianidade será o lugar teológico por excelência. O único lugar teológico é a história concreta que vivemos cada dia” diz Enrique Dussel[6]. Esta menção de Enrique Dussel, é básica para o pensamento teológico afro-americano. Para o/a teólogo/a que está refletindo a partir da realidade das comunidades negras nos diferentes continentes, a história é o precioso lugar do desvelamento de Deus. Esta realidade tem exigido uma profunda sintonia com o cotidiano das comunidades no qual Deus se faz presente. Daí emerge uma nova reflexão teológica “afro-libertadora”[7].

Modjumbá axé!
Pe. Degaaxé


[1] Cf. COLOMBIANITO. Teologia afroamericana. (polígrafo), p. 5.
[2] Cf. Id., Ibid., p. 7.
[3] REIS, Ari Antonio dos (Org.). Refletindo o rosto negro da Igreja: de Medellin à Aparecida., p. 40s.
[4] SILVA, A. A. da. In: ATABAQUE-ASETT. Agentes de Pastoral Negros: conscientização, organização, fé e luta., p. 14.
[5] Cf. REIS, Ari Antonio dos (Org.). Refletindo o rosto negro da Igreja., p. 17
[6] DUSSEL, E. Caminhos de libertação Latino-Americana., p. 11.
[7] Cf. COLOMBIANITO, Op. cit., p. 8.

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