segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

O QUE DEVEMOS FAZER PARA EXPERIMENTAR VERDADEIRA ALEGRIA?

Uma reflexão a partir da mensagem de João Batista (Lc 3, 10-18)

         Temos razões de sobra para cultivar a alegria, não porque faltem dificuldades ou que esteja tudo numa boa, mas porque Deus nos ama, está em nosso meio e nos traz a salvação. Feitos discípulos e discípulas de Jesus, a alegria e a esperança são nossas principais características, em meio a uma sociedade em que as situações parecem provar o contrário. De antemão, vive feliz quem reconhece a presença e a ação de Deus em sua vida. Quem deposita sua felicidade nas coisas ou bens que possui, vive equivocado e iludido. “Se foi para este mundo que colocamos nossa esperança somos as pessoas mais dignas de pena”, nos diz São Paulo. Estamos falando da alegria que o mundo não pode dar e da esperança que não decepciona, pois é fiel o Deus que nos ama.

        A presença e ação de Deus entre nós, razão de tanta alegria e esperança, traz consigo algumas exigências de mudança. Uma sociedade nova se faz com homens e mulheres que percebem a necessidade de conversão mais em si do que nos outros, libertando-se dos egoísmos pessoais e grupais. Nesse sentido, algumas personalidades bíblicas são fortes referenciais para assumirmos novo jeito de viver e de acolher o mistério do Deus que se encarna nas realidades humanas. Dentre elas, quero destacar três: Isaías, profeta da esperança, Maria profetisa da interiorização e João Batista, profeta da conversão. Esta reflexão foca especialmente João Batista.

        A forma decidida com a qual João assume a missão que Deus lhe confiou, o coloca em sintonia profunda com Jesus e seu projeto salvífico, embora sejam muito diferentes com relação à pedagogia. Quando comparamos os dois, vemos que João é a voz no tempo e Jesus é a Palavra que existia desde toda a eternidade. Quando o som da voz se cala o que permanece é a Palavra. Segundo santo Agostinho, sem a palavra a voz se torna “esvaziada de sentido. A voz sem palavras ressoa ao ouvido, mas não alimenta o coração”. A missão de João, portanto, tem sentido por causa da missão de Jesus. João anuncia um batismo de conversão, Jesus traz o novo batismo que faz nascer de novo através da água e do Espírito. João anuncia o julgamento de Deus, utilizando uma linguagem dura e ameaçadora; Jesus anuncia a misericórdia de Deus com uma linguagem cheia de ternura, sem forçar a liberdade das pessoas. Enfim, João se considera um instrumento que prepara os caminhos do Senhor; Jesus se declara o Caminho.

         Por outro lado, precisamos ficar bastante atentos às orientações que João dá, pois tem muito a ver com o sentido do verdadeiro batismo que Jesus veio nos presentear. Jesus é a nossa alegria e para que a experimentemos verdadeiramente, precisamos dar três passos fundamentais. Primeiro: Solidariedade e partilha com os mais necessitados. Não podemos reter os bens se os consideramos dons de Deus. Se são dons, devem ser partilhados; segundo: honestidade e justiça. Agir com justiça é imitar a Deus em sua gratuidade e generosidade, superando a tendência em querer tirar vantagem em cima dos outros; terceiro: não abusar do poder e da força. Ninguém deve se aproveitar da posição ou encargo que possui na Igreja ou na sociedade para se sentir melhor que os outros. Muitas vezes, agimos de modo violento e impositivo, pois nos sentimos ameaçados por quem pensa e age diferente de nós. Tememos perder nossos privilégios, nossas falsas seguranças.

        O advento pede de nós conversão, que só é possível na medida em que nos deixamos tocar e transformar pela graça de Deus. Mesmo assim ainda podemos nos iludir a respeito do resultado desta experiência, vivendo uma alegria alienante, indiferente ao que se passa ao redor. É certo que a alegria, que somos chamados a experimentar, o mundo não é capaz de dar. No entanto, ela não pode nos desligar da realidade; jamais será verdadeira uma alegria que nos fecha numa experiência intimista de Deus. Pelo contrário, deve nos abrir e nos lançar na experiência do encontro, da partilha e da solidariedade, conforme as exigências do nosso batismo. Nessas condições, não somente experimentaremos alegria verdadeira, mas seremos também causa de alegria para quem se encontra conosco.

Axé!
Pe. Degaaxé

domingo, 9 de dezembro de 2012

REVELAÇÃO CRISTÃ E CULTURAS AFRO-BRASILEIRAS À LUZ DA TEOLOGIA DE ANDRÉS TORRES QUEIRUGA

           Acredito que todos já devem estar sabendo que este é o título da minha dissertação de mestrado, defendida no último dia 04 deste. O tema é polêmico e complexo; o autor escolhido para orientar as reflexões também está envolvido em muitas questões polêmicas, pois reflete a mesma fé cristã com categorias e linguagens novas. Trata-se do legítimo pluralismo teológico. Ele nos permitiu pensar a revelação de Deus de modo ilimitado, dentro da história concreta dos homens e mulheres culturais em sintonia com as disposições do Concílio Vaticano II. Quando o Concílio fala de revelação, chama a atenção sobre a iniciativa livre de Deus que fala aos seres humanos como a amigos, convidando à sua comunhão íntima (cf. DV 1). Nada o obriga a se revelar nem o ser humano o merece, mas Deus não dispensa a resposta deste. A iniciativa é divina que interpela, mas existe a participação humana que capta, articula e expressa o impulso revelador que vem de Deus. Assim, as culturas, a partir de sua experiência religiosa, possuem elementos que possibilitam captar a revelação de Deus e responder com criatividade a esta dinâmica reveladora.
Nesse mesmo sentido podemos pensar a situação das culturas afro-brasileiras que, descendendo de povos profundamente religiosos, possuem uma visão religiosa da vida. A religiosidade popular brasileira está impregnada pelo jeito afro de conceber a vida, o ser humano, a sociedade e o próprio Deus. Nesse sentido, as religiões afro-brasileiras ou de matriz africana têm exercido um papel fundamental. Elas guardam história de reinos e famílias africanas, com suas experiências significativas e retratam períodos de dor, sofrimento e resistência do povo negro contra o sistema escravagista. Na relação com o cristianismo, há influência mútua devido a condicionamentos históricos. Por isso, acredita-se na possibilidade de um encontro positivo dessas religiões com o cristianismo, especialmente de matriz católica. A partir daí surgem alguns questionamentos: Em que condições este encontro é possível? Quais os passos que já foram dados nessa direção? O que ainda é desafio e quais são as perspectivas? Quais as contribuições que o jeito afro de ser e de conceber trouxe para a evangelização e para a reflexão teológica? De um modo geral, as culturas afrodescendentes são dinâmicas e possuem uma capacidade enorme de superação, porque agem pela fé; uma fé que é, ao mesmo tempo, herança ancestral e experiência atual – comunitária e pessoal; uma fé comprometida com a transformação da realidade e solidária com os anseios dos oprimidos de todos os tempos.
No intuito de responder a estas e outras provocações, é que me dediquei à presente pesquisa. A dissertação está dividida em três partes, que correspondem a três capítulos. No primeiro, trago um aprofundamento da razão da existência e sobrevivência das culturas afro-brasileiras, penetrando nas estruturas e rituais de algumas de suas religiões, especialmente o candomblé, a religião dos Orixás. Trata-se de um resgate da herança africana, de onde se origina toda a vitalidade da identidade das culturas afro-brasileiras. Só se pode compreender melhor a situação dessas culturas no Brasil, se resgatarmos suas raízes, através dos grupos étnicos africanos trazidos para cá como escravos, com sua teologia, visão de mundo e de ser humano.
No segundo capítulo trago, em linhas gerais, o pensamento do teólogo Andrés Torres Queiruga sobre o evento da revelação de Deus no cotidiano dos homens e mulheres de todos os tempos e as distintas formas de resposta ao Deus que se revela, reconhecendo que através das religiões, o ser humano não somente encontra respostas aos enigmas mais profundos de sua vida, mas consegue responder mais adequadamente ao Deus que se revela. Assim, a religião cristã, tendo em Jesus de Nazaré a máxima expressão da revelação divina, é chamada a se aproximar das culturas e de suas religiões com respeito e espírito fraterno, reconhecendo que nos diversos povos e culturas, o Espírito Santo espalhou as “sementes do Verbo”. Mesmo sem terem contato com a revelação cristã, são caminhos reais de revelação e podem contribuir com o que lhe é próprio para que a verdade seja alcançada por todas as pessoas que delas participam.
No terceiro capítulo aprofundo as implicações teológico-pastorais a respeito do encontro cristianismo e culturas negras, voltando a nossa atenção para a redescoberta que estas culturas fizeram da revelação cristã e sua contribuição para a um jeito diferente de conceber a presença e ação divinas. Assim, refletiremos também sobre a descoberta da negritude na Igreja, a solidariedade na luta com os pobres, resgatando os valores culturais que permitem uma maior dinamicidade litúrgica, através da inculturação. Tudo isso nos leva a perceber que a renovação da liturgia, proposta pelo Concílio Vaticano II (1962-1965), passa pela inculturação e não pode haver verdadeira e sólida evangelização se se dissocia das culturas dos homens e das mulheres locais. Como coroação desta pesquisa, não podia faltar uma provocação ao diálogo inter-religioso, destacando o essencial da identidade cristã frente à alteridade e à diferença, especialmente a diferença religiosa. O mandato missionário leva consigo, entre outros aspectos, a exigência do diálogo com as religiões dos povos. Especialmente com as religiões de matriz africana, o cristianismo católico assume a tarefa de buscar as ocasiões mais oportunas e os meios mais adequados para um diálogo verdadeiro e autêntico, reconhecendo as “sementes do Verbo” aí presentes.
O diálogo entre cristianismo católico e religiões de matriz africana é útil e necessário; faz parte do processo evangelizador e traduz uma consciência amadurecida de Igreja que não fecha arbitrariamente as possibilidades de revelação e salvação em terreno alheio, mas busca aproximação e acolhida. Uma nova perspectiva teológica da revelação possibilitará também uma nova postura diante das tradições religiosas de matriz africana que, como os cristãos e cristãs, vivem em busca da verdade e da plenitude.
Axé!
Pe. Degaaxé

REVELACIÓN CRISTIANA Y CULTURAS AFRO-BRASILEÑAS A LA LUZ DE LA TEOLOGÍA DE ANDRÉ TORRES QUEIRUGA.


          Creo que todos ya deben estar sabiendo que este es el título de mi disertación de maestrado, defendida en el último día 04 del corriente. El tema es polémico y complejo; el autor elegido para orientar las reflexiones también está envuelto en muchas cuestiones polémicas, pués reflexiona sobre la misma fe cristiana con categorías y lenguages nuevos. Se trata del legítimo pluralismo teológico. Él nos permitió pensar la revelación de Dios de un modo ilimitado, dentro de la historia concreta de los hombres y mujeres culturales, en sintonía con las disposiciones del Concilio Vaticano II. Cuando el Concilia habla de revelación, llama la atención sabre la iniciativa libre de Dios que habla a los seres humanos como a amigos, invitandolo a la comunión íntima (cf. DV 1). Nada lo obliga a revelarse ni el ser humano lo merece, pero Dios no libera la respuesta de éste. La iniciativa es divina e interpela, pero existe la participación humana que capta, articula y expresa el impulso revelados que viene de Dios. Así, las culturas, a partir de su experiencia religiosa poseen elementos que posibilitan captar la revelación de Dios y responder con creatividad a esta dinámica reveladora.
En ese mismo sentido podemos pensar la situación de las culturas afro-brasileñas que, descendiendo de pueblos profundamente religiosos, poseen una visión religiosa de la vida. La religiosidad popular brasileña está impregnada por la forma afro de concebir la vida, el ser humano, la sociedad y el propio Dios. En este sentido, las religiones afro-brasileñas o de origen africano han ejercido un papel fundamental. Ellas guardan historia de reinos y familias africanas, con sus experiencias significativas y retratan periodos de dolor, sufrimiento y resistencia del pueblo negro contra el sistema esclavista. Por eso, se cree en la posibilidad de un encuentro positivo de esas religiones con el cristianismo, especialmente de origen católico. A partir de ahí surgen algunos cuestionamientos:  En qué condiciones este encuentro es posible? Cuáles son los pasos que ya fueron dados en esa dirección? Qué es lo que todavía es un desafío y cuáles son las perspectivas? Cuáles son las contribuciones que la forma afro de ser y de concebir trajo para la evangelización y para la reflexión teológica? De un modo general, las culturas afrodescendientes son dinámicas y poseen una capacidad enorme de superación, porque actúan por la fe, una fe que es, al mismo tiempo, herencia ancestral y experiencia actual – comunitaria y personal, una fe comprometida con la transformación de la realidad y solidaria con los anhelos de los oprimidos de todos los tiempos.
En el intento de responder a estas y otras provocaciones, es que me dediqué a la presente investigación. La disertación está dividida en tres partes, que corresponden a tres capítulos. En el  primero, traigo una profundización de la razón de la existencia y sobrevivencia de las culturas afro-brasileñas, penetrando en las estructuras y rituales de algunas de sus religiones, especialmento el candomblé, la religión de los Orixás. Se trata de un rescate de la herencia africana, de donde se origina toda la vitalidad de la identidad de las culturas afro-brasileñas. Solamente se puede comprender mejor la situación de esas culturas en Brasil, si rescatamos sus raices, a través de los grupos étnicos africanos traidos como esclavos, con su teología, visión del mundo y de ser humano propias.
En el segundo capítulo traigo, en lineas generales, el pensamiento del teólogo Andrés Torres Queiruga sobre el evento de la revelación de Dios en lo cotidiano de los hombres y mujeres de todos los tiempos y las distintas formas de respuesta al Dios que se revela, reconociendo que a través de las religiones el ser humano no solamente encuentra respuestas a los enigmas más profundos de su vida, sino que puede responder mejor al Dios que se revela. Así, la religión cristiana, teniendo en Jesús de Nazaret la máxima expresión de la revelación divina, es llamada a aproximarse de las culturas y de sus religiones con respeto y espíritu fraterno, reconociendo que en los diversos pueblos y culturas, el Espíritu Santo espalló las semillas del Verbo. Aún sin tener contacto con la revelación cristiana, son los caminos reales de revelación y pueden contribuir con lo que le es propio para que la verdad sea alcanzada por todas las personas que de ella participan.
En el tercer capítulo  aprofundizo las consecuencias teológico-pastorales a respecto del encuentro del cristianismo y las culturas negras, volviendo nuestra atención para la redescubierta que estas culturas hicieron de la revelación cristiana y su contribución para una forma diferente de concebir la presencia y acción divinas. Así, reflexionaremos también sobre la descubierta de la negritud en la Iglesia, la solidaridad en la lucha con los pobres, rescatando los valores culturales que permiten una mayor dinamicidad litúrgica, a través de la inculturación. Todo eso nos lleva a entender que la renovación de la liturgia propuesta por el Concilio Vaticano II (1962 – 1965), pasa por la inculturación y no puede haber verdadera y sólida evangelización si se desvincula de las culturas de los hombres y mujeres locales. Como corazón de esta investigación, no podía faltar una provocación al diálogo interreligioso, destacando lo esencial de la identidad cristiana frente a la alteridad y la diferencia, especialmente diferencia religiosa. El mandato misionero lleva consigo, entre otros aspectos, la exigencia del diálogo con las religiones de los pueblos. Especialmente con las religiones de orígen africano, el cristianismo católico asume la tarea de buscar las ocasiones más oportunas y los medios más adecuados para un verdadero y auténtico diálogo, reconociendo las “semillas del Verbo” ahí presentes.
El diálogo entre cristianismo católico y religiones de origen africano es útil y necesario; es parte del proceso evangelizador y traduce una conciencia madura de la Iglesia que no cierra  arbitrariamente las posibilidades de revelación y salvación en terreno ajeno, pero busca aproximación y acogida. Una nueva perpectiva teológica de la revelación posibilitará también una nueva postura delante de las tradiciones religiosas de origen africano que, como los cristianos y cristianas, viven en busca de la verdad y la plenitud.
Axé!
Pe. Degaaxé
Tradução: Maria Erika Martínez