Para
compreensão deste artigo, aconselho a leitura do anterior. A rica religiosidade
da qual as culturas afro-brasileiras são portadoras tem sua origem no universo
religioso africano e este continua influenciando o jeito de viver a experiência
de Deus para os adeptos das religiões afro-brasileiras, também chamadas religiões de matriz africana. Urge um
aprofundamento, por parte da sociedade, sobre o dinamismo e ensinamento destas
religiões para uma postura mais acolhedora e dialética.
Religiões
originárias das culturas Yorubá
Na parte norte do país, da Amazônia às fronteiras
de Pernambuco, estas religiões estabeleceram um forte intercâmbio com as
religiões indígenas. Isso acontece na pajelança,
no Pará e na Amazônia, no encantamento,
no Piauí, e no catimbó, das demais
regiões. Em São Luís do Maranhão, os povos gege
deixaram traços de suas religiões, no tambor
de mina, que se assemelha ao vodu.
No resto do Nordeste a contribuição dos yorubá-nagô
foi muito mais marcante nos grandes centros urbanos e suburbanos,
particularmente, Salvador e Recife. Mais tarde, um contingente expressivo de nagô também foi deslocado para o Sul do
país. Com eles veio a religião dos Orixás, que recebeu novo nome, conforme a
experiência desses povos no novo contexto. Assim sendo, temos: o xangô, em Pernambuco, Alagoas e Sergipe
e o candomblé, na Bahia. No extremo
sul, particularmente, no Rio Grande do Sul, é chamada de batuques (cf. SOUZA Jr., p.
15) ou nação.
Religiões originárias
das culturas Bantu
As culturas bantu tiveram
maior influência na região sudeste do país e, em particular, no Rio de Janeiro
e São Paulo. Ali introduziram a religião de nome cabula. “Em alguns escritos, por volta de 1900, estes grupos
são chamados de “Cabula” e em torno dos anos 30 estes grupos são chamados de macumba, nome sob o qual eles se tornam
conhecidos em todo o Brasil” (BERKENBROCK, p. 149). A
tradição yorubá exerceu forte
influência sobre estes grupos, juntamente com o catolicismo popular, a pajelança
e o Espiritismo. Depois de tantas
influências e adaptações, passam a chamar-se quimbanda e umbanda. São
correntes diferentes dentro dum mesmo movimento religioso. Assim, a palavra umbanda
é o “culto para homenagear os orixás ou entidades e praticar despachos
benéficos e quimbanda, culto de Exu”
(CINTRA, p. 77).
Preconceitos
de ontem e de hoje
Já nos primeiros contatos dos colonizadores
com os povos africanos, os preconceitos se fizeram sentir, pois acreditavam que
estes povos não possuíam alma. Os que se estabeleceram lá e tentaram algum
intercâmbio religioso, referiam-se às Sagradas Escrituras para falar da revelação
divina, mas a característica da tradição africana é a oralidade; suas
revelações “aconteciam por meio de sonhos, presságios, adivinhações, visões e
possessões mediúnicas, e por isso os europeus acreditavam na sua origem
diabólica” (MATTOS, p. 84). No Brasil, a partir do século XVIII, foram
consideradas “práticas de magia”, “feiçaria” e “grosseira superstição”. Durante
o Estado Novo, em 1930, intensificaram-se as perseguições contra elas, pois eram
julgadas como sendo contra a moral pública, sobretudo porque faziam sacrifícios
de animais. A Constituição Federal salvaguarda o direito de culto a essas
religiões, mas o preconceito está tão arraigado na sociedade, que se tornou
comum a invasão de terreiros e a destruição de objetos sagrados por membros de
outros movimentos religiosos. Sobre isso, há casos recentes na Bahia. O que
estas religiões mais esperam da sociedade brasileira é serem respeitadas
enquanto alteridade e diferença.
Ensinamentos das religiões de matriz africana
Para os fiéis destas religiões, o
modo de viver é plasmado pela experiência religiosa, segundo a qual se deve viver
em harmonia com tudo o que existe, pois a realidade é parte do ser humano e o
ser humano é parte dela. Sua espiritualidade é essencialmente ecológica,
reconhecendo a natureza como santuário de Deus e a terra como um ser maternal e
fecundo. Por isso, as oferendas apresentadas são colocadas no chão, nas matas,
à beira de regatos, etc. Como a parte está no todo e o todo está na parte, a
dinâmica da vida vem de uma energia, presente em todas as coisas - Axé. Cultivam a unidade da vida,
acreditando que o mundo visível – Aiye – é
um prolongamento do mundo invisível – Orum,
ou seja, tudo o que existe é envolvido pela dimensão do sagrado. O ser
humano deve realizar ações de cuidado com a natureza e tudo o que existe, pois
isso contribui para manter o equilíbrio e a harmonia do universo.
Axé!
Pe. Degaaxé
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