sexta-feira, 30 de novembro de 2012

A DIMENSÃO COMUNITÁRIA NAS CULTURAS AFRO-BRASILEIRAS


As culturas africanas concebem o ser humano como parte integrante do universo. Nesta participação e comunhão com o universo, o ser humano encontra um dos fundamentos do viver e isto é possível por conceber a terra como um ser vivo, maternal e fecundo. Mas esta participação só é possível se ele está integrado a uma família, a uma comunidade. Esta experiência caracteriza sua identidade de forma bem original, pois para os povos bantu, Deus (NZambi) quando criou o ser humano, o fez de forma comunitária. Num só ato, criou toda a comunidade familiar: o homem, a mulher e as crianças. Portanto, além de ser a mais antiga instituição, é também o conceito fundante para a compreensão da origem e do destino do mundo e das pessoas. Também para os yorubá não será diferente: Deus (Olorum) criou, num mesmo instante, o homem e a mulher. Os criou juntos, fazendo com que a comunidade fosse o centro de suas vivências e é nela que eles devem buscar continuamente reforçar o Axé, em vista de uma vida harmonizada e realizada, conforme o teólogo A. A. da Silva. 
As culturas afro-brasileiras conservam muito esta característica, pois para elas “o Deus da vida é um Deus comunitário. Deus chama e salva não somente o indivíduo, mas todo o povo. Neste caso, o papel fundamental continua sendo da família, como base para construção e compreensão comunitária”, segundo Marcos R. da Silva. Este aspecto mereceu especial atenção no documento de Aparecida, segundo o qual, “os afro-americanos se caracterizam, entre outros elementos, pela expressividade corporal, o enraizamento familiar e o sentido de Deus” (DAp 56). Está muito presente nas reflexões teológicas na ótica do povo negro, segundo destaca o teólogo negro A. A. da Silva: “A comunidade é, portanto, o ponto de referência na vida e na morte: ‘Quem vive comunitariamente, não morre jamais - Ao terminar os seus dias, permanece na comunidade como ancestre’. Ao contrário, ‘quem vive de maneira exclusivista, egoisticamente, morre e não se torna nada mais que um cadáver’.  A comunidade é o critério para a salvação (...) A salvação vem da vivência, da participação e da integração comunitária. Fora da comunidade não há salvação”.
A comunidade é, então, o ponto de intercâmbio entre os vivos e os mortos; é encontro do mundo visível com o invisível. É o centro da unidade que dirige cada pessoa no encontro com os Antepassados, parentes e estranhos. Toda pessoa tem necessidade de viver amparada, sentir o calor humano e a solidariedade do grupo, sem os quais se sentiria perdida e sem horizontes para caminhar e realizar-se. O dinamismo vital – Axé – só é possível em comunidade. A pessoa encontra sua força vital se está em comunhão, se participa da sorte da comunidade. Fora desta - em que acontece a transmissão do Axé - a vida perde o sentido. É certo que a experiência de pertença divina é individual e que a pessoa deve assumir com responsabilidade, mas ela só a vivencia como membro de uma comunidade. Em outras palavras, o desenvolvimento das potencialidades humanas só é possível mediante a experiência comunitária.
A vida, portanto, só tem sentido se for em comunidade, se o ser humano se sentir multiplicado nos demais membros, o que resgata o sentido da família ampliada ou alargada, conforme Franziska Rehbein. Esta realidade é um apelo a somar esforços para combater toda forma de marginalização, que representa um atentado ao jeito afro de ser e que fere princípios fundamentais da pessoa humana. Portanto, o que acontece no individual tem a ver com o todo, proporcionando harmonia ou desarmonia. Sem o sentido comunitário do viver a pessoa se prejudica e, consequentemente, compromete todo o universo. Em outras palavras, a pessoa é chamada a dar a vida pela comunidade.
Axé!
            Pe. Degaaxé

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