sábado, 8 de junho de 2013

UMA LEI QUE NÃO HUMANIZA NEM DEVERIA TER SE TORNADO LEI


Uma reflexão a partir de Marcos 12, 28b-34
 
        Segundo as Sagradas Escrituras, Deus tem uma relação particularizada com o povo de Israel. Ele estabelece com este povo uma aliança, dando algumas orientações para que possa caminhar em segurança, preservando a vida. Neste contexto é que nascem os Mandamentos. A palavra Mandamento ou Lei aqui não tem a mesma conotação que tem em nossos dias. Mais do que obrigatoriedade trata-se de essencialidade. Viver os mandamentos tornou-se essencial na caminhada do povo de Israel para o qual a Lei é Palavra de Deus ou vice-versa. Quando afirmam que “a Lei do Senhor é perfeita, conforto para a alma”, estão se referindo à Palavra. Há uma correlação profunda entre Lei e Palavra, pois os mandamentos da Lei expressam o cuidado amoroso do Deus que fala, apontando caminhos de libertação e também revelam a verdadeira identidade de um povo que obedece, cultivando o sentimento de pertença a seu Deus. A obediência aos mandamentos é fonte de bênçãos que leva à vida; ao passo que a desobediência a estes leva à morte.
          Em torno da Lei principal, os judeus fizeram surgir outras tantas leis que aos poucos desviaram o foco daquilo que era essencial. Os dez mandamentos iniciais se tornaram 613, dos quais 248 são prescrições e 365 são proibições. Os pobres eram considerados pecadores porque não conseguiam memorizar todos esses mandamentos e, portanto, não os praticavam. No entanto, esta parcela da população conhecia e cultivava o essencial da Lei. É sobre isso que Jesus chama a atenção quando afirma: “Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com todo o teu entendimento e com todas as tuas forças” (Dt 6, 4-5) “e a teu próximo como a ti mesmo” (Lv 19, 18). Amar a Deus é o primeiro de todos os mandamentos, mas Jesus o conectou ao amor ao próximo, mostrando que não é possível amar a Deus sem amar o próximo. São Tiago, em sua carta, chama de mentiroso a quem diz amar a Deus e não ama o seu próximo. Do mandamento de amar a Deus brota o amor ao próximo, como um fruto. A fonte é sempre Deus, pois foi ele quem primeiro nos amou. É a partir do amor que Deus tem para conosco - de forma gratuita e generosa - que é possível amar desinteressadamente os demais. “Este é um desafio para todas as culturas incluindo aquelas na África, onde a fidelidade à família e às tradições é frequentemente cultivada como o primeiro mandamento” (African Bible, p. 1770).
        Mas para Jesus permanece o essencial: amar a Deus, amando também o próximo. Sua admirável pedagogia permitiu que esses dois mandamentos se tornassem ainda mais acessíveis, pedindo que apenas nos amemos uns aos outros como ele mesmo nos amou. Assim como Deus nos amou em Cristo, devemos amar a partir de Cristo. Quem ama desse jeito entendeu o essencial da vida. Quem segue Jesus não segue uma lei ou uma doutrina, mas uma pessoa. Em nossa sociedade e comunidade estamos sujeitos a leis, mas não podemos nos tornar escravos delas. Pessoas maduras e equilibradas entendem que o que mais conta não é a lei em si, mas o espírito que motiva a lei e a postura que se assume diante dela.  A partir daí acreditamos que toda lei deveria ter por objetivo humanizar as pessoas. Se existe uma lei que não humaniza nem deveria ter se tornado lei. A lei é esvaziada do seu verdadeiro sentido quando apenas serve para oprimir, favorecendo privilégios e interesses de alguns. O desafio para nós hoje é fazer de toda lei instrumento de fraternidade onde o amor a Deus e amor ao próximo são cada vez mais evidenciados.
 

Pe. Degaaxé

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