sábado, 29 de outubro de 2011

O ANSEIO PELA UNIDADE EXPRESSO NA BUSCA DA VERDADE

Penetrar um pouco no cerne do pensamento deste autor, Florenskij, está sendo uma aventura e tanta! Neste quarto artigo queremos nos deixar convencer sobre os verdadeiros motivos que nos levam a buscar a verdade. E de que verdade estamos falando? É sabido que o anseio pela unidade existe no coração dos fiéis seguidores de Cristo desde os primórdios do Cristianismo, quando o próprio Cristo rezava ao Pai: “que todos sejam um” (Jo 17, 21). Mesmo divididos, em toda parte, pequenas iniciativas sempre manifestaram este anseio latente nos corações. O discurso sobre a unidade não se refere à uniformidade ou anulação das diferenças, mas em acolher o diferente, respeitando-o no seu modo de ser e refletir, descobrindo sempre mais o que causa aproximação. Esta busca não impede que se pense diferente, mas empurra, ambas as partes, à verdade que os une. Quando Jesus diz que é a verdade e quem é da verdade ouve a sua voz, não se refere a ritos, fórmulas ou modos de fazer as coisas, características acidentais. Ele chama a atenção para o que é essencial: a verdade que Ele é. Sobre isso isso, Florenskij estava muito convencido, pois “em si a humanidade, porém, não tem necessidade de unidade enquanto tal e a qualquer preço, mas de uma vida na verdade e no amor”[1]. Esta vida na verdade e no amor faz referência ao próprio Jesus que se faz presente onde dois ou mais estiverem reunidos em seu nome (Cf. Mt 18, 20).
Em questões de fé, eu não devo impor a ninguém as formas concretas de vida religiosa que cultivo, ou seja, aquilo que creio e aceito como verdade. Seria muita pretensão da minha parte e violaria o mandamento do amor se impusesse  a pessoas de outra confissão aquilo que é razão e sentido para mim. Aquilo que é significativo para mim, para outros pode não ter significado algum. Esta sensibilidade deveria me aproximar mais das pessoas que pensam e rezam diferente de mim, pois “discordâncias e diferenças serão, de qualquer maneira, inevitáveis”[2], mas o importante é saber o que fazer com elas.
“As diferenças entre as confissões não devem ser ‘polidas’ em nome da unidade; ao contrário, é muito importante estabelecê-las com precisão. Se formos movidos por autêntico amor e confiança (...) tais diferenças não serão motivo de hostilidade, mas, ao contrário, criarão um senso de partilha do mundo cristão e de devoção diante dos caminhos da Providência”[3].
Este modo Florenskijano de pensar nos recorda a postura do bispo D. Hélder Câmara, de saudosa memória, quando alguém discordava dele. Assim ele dizia: “se você discorda de mim, você não é meu adversário, mas você me enriquece”[4]. Sobre a situação da diversidade e da divisão, o nosso autor não é pessimista e consegue tirar grandes lições:
“É necessário de fato que aconteça divisão entre vós’, o olho não se assemelha à mão, e a sua estrutura lhe é de todo estranha. Não por isso, porém, pode dizer à mão: ‘Não preciso de ti’, como, vice-versa, nem a mão pode dizer ao olho que não compreende: ‘Não preciso de ti’. Num organismo sadio, todavia, os órgãos – cada um com uma própria função diversa das funções alheias – vivem em concórdia e tem necessidade um do outro e todos servem o único organismo”[5].
Esta analogia com o corpo humano, em sua dinâmica de funcionamento, permite que o nosso autor, Florenskij, admita uma “divisão necessária”. São Paulo, realmente foi brilhante quando escreveu isso em seu tempo e, para o assunto em questão, continua sendo uma verdade muito atual. Os cristãos são o Corpo de Cristo e este corpo precisa funcionar devidamente para cumprir sua verdadeira finalidade. As pessoas não precisam só ouvir coisas boas sobre Jesus, mas experimentarem, junto aos cristãos, a verdade deste anúncio, através do testemunho de comunhão.

Modjumbá axé!
Pe. Degaaxé


[1] FLORENSKIJ, Op. Cit., p. 5.
[2] Id., Ibd., p 5.
[3] Id., Ibid., p. 6.
[4] D. Hélder Câmara, bispo brasileiro,  nascido em Fortaleza, a 7 de fevereiro de 1909, e falece a 27 de agosto de 1999. Na época foi duramente criticado e perseguido por causa de sua postura profética junto aos pobres.
[5] FLORENSKIJ, Op. Cit., p. 5.

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