A evangelização tem um
caráter universal, porque é universal a salvação que Jesus Cristo propõe,
fazendo acontecer o seu reino no contexto das diversas culturas, conforme bem
expressa o papa Paulo VI na Evangelii Nuntiandi:
“O reino que o Evangelho anuncia é vivido por pessoas
profundamente ligadas a uma determinada cultura, e a edificação do reino não
pode deixar de servir-se de elementos da civilização e das culturas humanas”
(EN 20). Em outras palavras, para evangelizar, é necessário aproximar-se das
culturas e dialogar com elas, reconhecendo nelas a ação do reino de Deus ou o
reino de Deus em ação. “A
ação de Deus, através do seu Espírito, dá-se permanentemente no interior de
todas as culturas. Na plenitude dos tempos, Deus enviou seu Filho Jesus Cristo,
que assumiu as condições sociais e culturais dos povos” (SD 243). Esta realidade aponta para outro
importante tema desta pesquisa: a inculturação.
Quando falamos em inculturação, não se trata de uma ação opcional ou secundária, mas
de um aspecto realmente fundamental na evangelização. Basta relacionarmos com o
processo da Encarnação do Filho de Deus[1], para entendermos a sua
importância. Sobre isso, o autor moçambicano A. Langa, afirma que a
inculturação é o outro nome da encarnação de Jesus Cristo, em cada cultura
existente ou que virá[2].
Mencionando algumas tribos africanas, o mesmo autor reforça a compreensão: “Se
ontem Jesus falou e rezou em hebreu e em aramaico, Ele quer hoje falar e rezar
em xangana, em nyanja, sena”[3],
guarani, yorubá, etc. A encarnação de Jesus se deu de modo universal e
permanente, contemplando todos os povos e culturas. Através da inculturação, esta encarnação de fato se
torna mais sentida nas mais desconhecidas realidades. O documento da
Conferência de Santo Domingo também faz referência a esta analogia: “A analogia
entre a encarnação e a presença cristã no contexto sócio-cultural e histórico dos
povos suscita para nós o problema teológico da inculturação. Esta inculturação
é um processo que vai do Evangelho ao coração de cada povo e comunidade com a
mediação da linguagem e dos símbolos compreensíveis e apropriados segundo o
juízo da Igreja” (SD 243).
A CNBB define a inculturação como o “processo de inserção do Evangelho no
quotidiano de um povo, de tal forma que ele possa expressar sua experiência de
fé em sua própria cultura”[4]. Neste processo, o Evangelho se encarna em uma determinada cultura a fim de que a
mesma possa expressar sua fé através da linguagem e símbolos que lhe são
próprios. Quando se alcança este nível de maturidade no processo, temos o
nascimento de uma nova criação. A
inculturação pode ser definida ainda
como “uma íntima transformação dos valores culturais autênticos, graças à sua
integração no cristianismo e ao enraizamento do cristianismo nas diversas
culturas humanas”[5].
Tanto uma como outra afirmação destaca o resultado de um misterioso intercâmbio
de valores, que implica em enriquecimento para a cultura e enriquecimento para
a Igreja. Trata-se de um inserir-se para integrar. Este dúplice
movimento é fundamental, no que concerne a uma evangelização autêntica. Em
outras palavras, “com a inculturação, a Igreja encarna o Evangelho nas diversas
culturas e, ao mesmo tempo, introduz os povos com as suas culturas na própria
comunidade’” (RM 52)[6].
Axé!
Pe. Degaaxé
[1] “Inculturação é o processo que põe frente-a-frente o
Evangelho e uma dada cultura, para que o mesmo Evangelho se incarne, à maneira
de Jesus Cristo que se fez homem”. (LANGA, A. Op. cit., p. 79). Sobre isso temos ainda uma contribuição do
Bem-aventurado João Paulo II: “Este dúplice movimento, em ato na inculturação,
exprime, portanto, um dos componentes do mistério da Encarnação” (João Paulo
II. Exortação Apostólica Catechesi
Tradendae. n. 53, 16 de out. de 1979. Apud CONGREGAÇÃO PARA O CULTO DIVINO.
A liturgia romana e a enculturação, p. 8).
[2]
Cf. LANGA, Adriano. Op. cit., p. 85.
[3] Ibid., p. 85.
[5] CONGREGAÇÃO PARA O CULTO DIVINO. A liturgia romana e a inculturação, p. 7.
[6] Esta realidade foi explicitada no Concílio, no
documento sobre a Sagrada Liturgia e retomado com vigor nas Diretrizes Gerais
da Evangelização da Igreja no Brasil, doc. 61, 1999-2002, nº 263, p. 158.
Também queremos ressaltar que outro documento da CNBB sobre Pastoral afro, princípios de orientação, na
página 52, também trabalha muito bem este assunto.
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