É e sempre será tempo de profetismo. Esta realidade sempre caracterizou a experiência religiosa do povo de Israel desde o tempo de Moisés. O profetismo é o ponto de encontro do ser humano com a Palavra e a vontade de Deus. O Profeta é aquele que se dispõe à experiência da Palavra de Deus e a interpreta para o povo na sua realidade concreta.
A Sagrada Escritura apresenta Deus como alguém que se revela ao seu povo através de acontecimentos e palavras; De modo preferencial, ele se auto-comunica através da Palavra e quando fala, sua Palavra cria (Gn 1: ‘Faça-se...’); chama, elege e constitui um grande povo (Gn 12: ‘Sai da tua terra e vai...’, ‘farei de ti uma grande nação’); liberta e salva (Ex 3: ‘Eu vi a miséria do meu Povo... vai, eu te envio... deixa o meu povo ir’). Esta experiência que era de um povo, amplia-se e recebe uma interpretação universal e definitiva na pessoa de Jesus Cristo, Palavra eterna do Pai que se encarna nas realidades humanas, de sorte que o povo vai percebendo, através de seus gestos, palavras e práticas que se trata do Filho de Deus, Aquele que fala com autoridade porque é revelador do projeto do Pai.
O ponto alto da Revelação no Antigo Testamento é a Aliança no Monte Sinai com Moisés. A partir da experiência de Deus que ele realiza, recolhe fielmente as orientações para conduzir o Povo rumo à Terra Prometida. Esta experiência vai ser determinante para a construção e identidade do povo, assim como vai ser determinante para a concepção que este povo terá de Deus. Javé é o Deus dos Ancestrais, o Deus da história, o Deus que liberta e caminha com o povo. A infidelidade à Aliança levará este povo a experimentar grandes desordens: divisão dos reinos, invasões, cativeiro. Os profetas vão interpretar esses acontecimentos, ajudando o povo a não desanimar na caminhada de adesão ao projeto de Deus e a manter firme a esperança no futuro.
Para que a atividade profética seja determinante na vida do povo e cumpra a sua finalidade, o próprio Deus põe suas Palavras na boca do profeta para que ele fale somente o que lhe for mandado, diferentemente dos falsos profetas, que são enganadores: mais transmitem palavras humanas do que Palavra de Deus. O profeta é constituído por Deus, não para estar com o poder político e religioso – com os quais sempre esteve em conflito - mas ele é chamado a ser porta-voz, instrumento de sua Palavra a fim de que sua mensagem chegue a todas as pessoas. O profeta não tem força de persuasão e convencimento por si mesmo, mas anima o povo pela força que vem da Palavra.
Quando nos referimos a Jesus, estamos falando do profeta por excelência, que comunica a novidade da Palavra de Deus pela autoridade que foi dada diretamente do Pai. Diferentemente dos escribas e fariseus, comparados aos falsos profetas, ele fala com autoridade, por ser é uma pessoa autêntica, verdadeira: aquilo que ele fala está de acordo com a sua conduta. Como ele não está preso a nenhum poder político ou religioso, torna-se ruína para os espíritos maus, símbolo das forças de morte que paralisam, alienam e exploram as pessoas. A presença de Jesus denuncia a ação de forças contrárias ao projeto de Deus. A sua ação faz a diferença no meio deste povo; daí a razão da sua autoridade. Sua autoridade é seu engajamento profético. Jesus autoriza o povo a ser também presença profética, reconhecendo os sinais do Deus que o visita e revela seus planos de amor porque quer as pessoas livres.
O profetismo hoje tem inúmeros rostos e situações. A própria comunidade cristã foi constituída profeticamente por Jesus, ao escolher dentre as inúmeras pessoas de seu tempo, aquelas rejeitadas. Esta comunidade leva adiante a missão de Jesus pelas opções que é chamada a fazer, mantendo o foco de atenção nos menos favorecidos. A profecia é, na Igreja, sinal de sua vitalidade. Numa sociedade excludente e elitista como a nossa, se a Igreja não fizer a diferença, ela deixa de ser Igreja de Jesus Cristo. Ela não pode estar amarrada a nenhuma força ou poder terreno, pois assim compromete a sua ação profética. Estando num ano de eleições, aproximam-se o período das propostas e promessas. Muitos dos que se dizem cristãos, facilmente se deixam comprar por qualquer merrequinha de quem faz jogo sujo na política (sexta básica, passagem, doação em dinheiro em troca do voto). Quem tem atitude profética, não só não aceita, mas denuncia este tipo de jogo. É preciso estar atentos, pois se não cuidarmos estaremos vendendo nossa capacidade de decisão, comprometendo nossa identidade cristã e nossa ação profética. Se ontem tínhamos Elias, Isaías, Jeremias, hoje temos Rosana, Bernadete, Valdecir, Vera, José, Maria, padres, bispos, religiosos e religiosas, inúmeros profetas e profetizas do nosso tempo, que empenham o melhor de suas vidas nos diversos lugares onde a Igreja está presente e é chamada a se posicionar pela causa da justiça e em favor dos mais necessitados. Lembramos também de outras figuras proféticas que não estão dentro da Igreja, mas que também são sinal do reino de Deus que não tem fronteiras. Peçamos a Deus a coragem e a ousadia para testemunhar incansavelmente sua Palavra, empenhando o melhor de nós para animar nossas comunidades a manterem-se firmes na esperança e na fidelidade ao Projeto de Deus. Este é o nosso profetismo hoje.
Modjumbá axé!
Pe. Degaaxé
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