DEUS ACOLHE NOSSA RESPOSTA, RESPEITANDO A NOSSA LIBERDADE[1]
Falando a um povo que está em exílio, Ezequiel convoca à fidelidade a Deus. Estamos lidando aqui com questões de conduta moral, fruto de escolhas e que pouco a pouco vão definindo o rumo da existência. Da parte de Deus não faltam critérios de julgamento para se tomar decisões e rever certas escolhas que se faz. Não podemos achar que Deus é vilão de nossos infortúnios, de que não pensa em nós e de que quer nossa ruína. Deus é amor e quer que todas as pessoas se salvem. Faz festa quando alguém retoma o caminho por ele proposto. Está à nossa porta para que, ao bater, nós possamos acolhê-lo.
O mal, o sofrimento e a morte não são queridos por ele, mas ele jamais nos abandona, principalmente nestes momentos. Quando alguém está numa pior e diz: “vivo como Deus quer” ou “estou carregando a cruz que Deus me deu” ou ainda “meu Deus, por que fizeste isso comigo?” Estas são questões injustas e sem fundamento dirigidas à pessoa errada, como se Deus fosse injusto ou culpado. Ao invés de acusa-lo de injusto é preciso mudar de mentalidade. “Deus tem para conosco uma única intenção: ajudar o pecador a entrar no caminho da vida e da verdade. O mal não pode vir dele; depende da finitude do mundo e dos atos humanos. Mas ele nos convoca e nos apóia na luta contra o mal. Assim, por exemplo: Deus não está na enfermidade, está no enfermo contra a enfermidade”[2]. Portanto, devemos rever as imagens de Deus que cultivamos e vejamos se elas não têm sido prejudiciais na descoberta do verdadeiro rosto de Deus.
Na parábola do pai que tinha dois filhos, Jesus nos convida a fazer a experiência de um Deus que é um Pai bom, que dispensa generosa e gratuitamente os seus dons a todas as pessoas. Convoca-nos a trabalhar na sua vinha. Há um sim inconsistente e infiel; e há um não que depois se transforma em sim generoso. Na verdade, ele não nos obriga a uma resposta à altura porque também jamais conseguiríamos. A ação de graças é a atitude mais conveniente. Um coração generoso e agradecido é mais sensível para perceber que Deus está sempre surpreendendo com novos sinais de sua bondade. Portanto, segundo a parábola, Deus tem muitos filhos que nem sempre correspondem ao que ele espera, mas acolhe suas respostas, respeitando a liberdade de cada um.
Deus não nos cobra nada, não nos pede nada, só ama e, por amar, nos dá tudo. O seu amor em nós nos leva a uma atitude de busca e correspondência. É preciso uma fé amadurecida para responder, levando em conta a vontade de Deus e não apenas interesses pessoais. O documento de Aparecida nos convida a recomeçar a partir de Jesus Cristo (DA 12, 41 e 549), tendo em nós os mesmos sentimentos que havia nele, tema trabalhado por São Paulo, na segunda leitura. É preciso uma kenosis (esvaziamento) em cada cristão. Este valor é o diferencial numa sociedade em que predominam os contra-valores do egoísmo e do individualismo. “Importa mostrar que Jesus Cristo não viveu fechado em si mesmo, mas, esvaziando-se, veio ao encontro da humanidade. Não vivia para si. Vivia para o Pai e para os demais”[3]. São Paulo continua dizendo “nada façais por vanglória, considerando os outros mais importantes que a si”. O diferencial do ser cristão está justamente aqui: na disponibilidade para servir, fazendo-se tudo para todos, mas na humildade e simplicidade, que tornam qualitativo o nosso serviço. Não sou melhor do que ninguém, mas devo ser diferente, por princípios, por convicção. Trata-se de uma vida cristã acentuadamente kenótica, a exemplo do próprio Jesus que veio, não para ser servido, mas para servir.
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